quinta-feira, 23 de julho de 2015

O Pardo - A Mudança



Estava escuro mas quentinho. Aquela calmaria era ao mesmo tempo maravilhosa mas preocupante. Estava certo. Começou com um leve tremor e depois aperto daqui, aperto de acolá, alguma coisa me virando de cabeça para baixo. Ouvi vozes nervosas. Não entendia bem o que era dito.
Comecei a ficar nervoso. Senti passos ligeiros. Alguma coisa estava grudada em mim. Antes não estava.
Mais vozes. Me colocaram na horizontal. Voltou a calmaria mas logo depois começou o empurra-empurra de novo.
Acenderam uma lanterna. Fechei os olhos Não estou acostumado a luz forte. O empurra-empurra continuou e de repente um clarão brilhante.
Alguém me segurava pela cabeça e me puxava. Até aí tudo bem. De repente me deram um tapa na bunda. Sacanagem. Aí eu chorei de raiva.
Mas não adiantou muito. Vira prá cá, virá prá lá, me esfregam. Tento me acalmar para ver o que está acontecendo e escuto uma voz feminina:
- Doutor, é um menino. O que vou colocar na cor?
- Põe aí, PARDO
Pardo!!!!!
Na minha simbiose já tinha ouvido falar em rosa,azul, vermelho, verde mas pardo como cor, não.
Abri o olho tentando me acostumar com aquele clarão e então me aproximaram da minha simbionte, conheci pelo cheiro. Maravilhoso.
Ouvi vozes de novo.
- Mamãe olha que menininho lindo!!
Achei aquilo meio falso mais foi fantástico pois descobri que aquela linda mulher, que era meu simbionte tinha o nome de mamãe.
Fiquei olhando para ela era muito linda. A única coisa que estranhei era que o cabelo dela estava um pouco em pé.
Lindos olhos, nariz fino , lábios grossos, uma pele marronzinha suave, mãos finas e delicadas e uns peitos. Gente que peitos!!!!!
Dei uma mamada!!!! A primeira é inesquecível!!!!!
Depois me colocaram em local cheio de pequenos ex-simbiontes. Uma zona!!
Fiquei olhando as cores, uns branquinhos, outros amarelinhos, outros marronzinhos, outros pretinhos e tinha um que estava dentro de uma casinha que estava verdinho. Não gostei daquele verde. Mas não identifiquei nenhum PARDO, exceto eu.
Logo depois conheci um cara grande, branco, cabelo diferente da minha mãe pois o cabelo ficava para baixo.
- Garotinho do papai. Meu saquinho roxo.
Aquele camarada tinha o nome de papai. Parecia gente boa. Tentei olhar para meu saquinho mas não consegui.
No dia seguinte saímos da Pro Matre. Papai falou este nome.

- Qual o nome do menino, mamãe?
- Rilden
- Hilden!!! Mas este menino é pardo e com este nome. É alemão???
- É um longa história de origem pernambucana. Deixa prá lá.
- Tá certo mamãe. Ele já está matriculado no Jardim da Escola Pública.........
Pensei; pardo é cor ou nacionalidade???

Beatles, época de rebeldia. Cabelos longos, calças boca de sino e “Saint tropez”.
Rock and roll. Maconhazinha. Bailizinhos com vitrola.
- Rilden, traduz esta letra dos Beatles prá gente.
- Tá bom vou ver.
Que cara chato. Só porque eu tenho bolsa de estudo.
Não sou rebelde até porque com este cabelo que herdei de mamãe não dá. Ele tem partículas anti-gravidade. Só cresce para cima.
Coisa de pardo. Já viu pardo rebelde. Não dá!!!
Gostava de um sambinha de quintal. Coisa de pele ou de pardo. Não sei. Vou deixar quieto.
Namorar nesta idade era difícil. Meu perfil era anti anglo-saxônico.

- Aspirante Albuquerque está aprovado em todos os exames. Apresentar-se na próxima segunda-feira com cabelo cortado. Eis seus exames.
- Ok, sargento
Lalari, lariri......Êpa!! Cor branca. Ou o branco aqui tem muitas matizes ou estes camaradas erraram no preenchimento.
- Mãe, acho que subi na escala social, agora eu sou branco.
- É meu filho, meu sonho é você ser um nórdico, rsrsrs.

- Engenheiro Albuquerque, eis aqui a sua carteira do CREA, parabéns e uma carreira de sucesso.
Adivinhe, corri os olhos na segunda página e lá estava; cor branca.
Que coisa!!!!!

O tempo escorreu, veio a prole. Adivinhe; todos brancos.
Comecei a ser chamado de doutor.
Os cabelos rarearam e estão ficando acinzentados.
Os olhos clarearam um pouco, as vezes quase verde.
Saudades da minha mãe, que se estivesse aqui diria:
- Meu filho você é um sueco!!!!!!!

domingo, 12 de julho de 2015

Nas Estreitezas da Vida

Gente, tem hora que você sente que que o conforto acabou. Algo aconteceu. O espaço diminuiu ou você cresceu. Parece que a vida ficou mais estreita e você sente que vai engargalar. E aí, o que fazer?
Bem, depende como você enxerga a situação. Possibilidades?

Você sabe que sabe que está acontecendo.
Você sabe que não sabe o que está acontecendo.
Você não sabe que sabe o que está acontecendo.
Você não sabe e presume que sabe o que está acontecendo.

Quando você sabe que sabe o está acontecendo momentos de angústia virão. O conteúdo do cálice terá que ser bebido mas o renascer ocorrerá. Um novo espaço, um novo tempo e novos sonhos.

Quando você sabe que não sabe, a procura se inicia. Existe um potencial enorme de se achar um novo caminho mas o desespero ronda pois a cada momento a vida se torna mais estreita. Tempos difíceis até achar o caminho.

Quando você não sabe que sabe. É aquele momento que você se alienou. Você não percebe que você engargalou, não vai para frente, não vai para trás.Em algum momento a porrada virá. A dor será intensa e se você suportar conseguirá ver com clareza um novo caminho.

Você não sabe e presume que sabe. Ouso a dizer que você descerá aos infernos pois é aquela situação em que você procurará soluções no passado não compreendendo que o passado lhe colocou nesta situação. A relação entre você e a vida é; ou ela alarga ou você encolhe. Difícil alargar a vida e talvez para você, encolher seja a solução para restabelecer o estado anterior. Você se comprime, se tensiona e descobre que o conforto não se estabeleceu. A violência continua em um ciclo interminável. Enquanto a humildade não prevalecer o sofrimento é inexorável.

Pense agora estamos falando de você, um ser único, algo em tese, pois para existirmos, precisamos do outro. Veja cada situação desta quando temos um(a) parceiro. Complica bastante. Quanta dor, quanto sofrimento podemos gerar com o nosso desconforto com as estreitezas da vida.
Pense quanta violência pode ser praticada ao presumir que sabe, não sabendo, por vaidade e orgulho. Amplie para família, comunidade e até nação. Exemplos não faltam.

Acredito que o conhecimento transcende e evoluciona e a ignorância violenta e mata.

Vivemos momentos difíceis pois muitos não sabem e presumem que sabem. Manipulação, contra-informação, má-fé, dogmatização nos levam a situações extremas de ignorância.

As estreitezas da vida existem desde que o mundo é mundo. Parar,ouvir, pensar,analisar e ponderar é algo que estamos esquecendo de fazer. Fazendo isto vem o respeito pelo próximo e fazendo isto, talvez ,venha até o amor, fazendo isto, sempre haverá um renascer.