Ele se foi. Acredito que já estivesse na hora. Foi um processo longo de aprendizado para ele e para mim. O tempo se encarrega de abrir e estreitar as faixas. São os ciclos de expansão e contração da vida.
Vivenciar o ciclo de contração com certeza não é fácil.
Seu ciclo biológico, físico, social e econômico vai se encerrando. Um legado foi criado, seja grande ou pequeno. Esta foi a sua bagagem que independente do tamanho pode ser leve ou pesada.
Ao olhar para frente o futuro parece velado, não se tem muitas certezas neste novo horizonte e surge a grande pergunta ; " o que fazer neste futuro ?"
Tocar a vida, diriam alguns. Sim, mas como?
Durante anos o vi tocar a vida. Estava do seu lado e sinceramente muitas coisas não entendia o porque?
Ações e reações muitas vezes sem causalidade. Não que o seu passado fosse algo pesado, para mim, mas era algo que ele não conseguia se desligar. O seu futuro parecia parecia estar em sentido inverso. Do presente para o passado. Ele vivia o presente em função do passado. Seria triste este fato?
Não sei mas observei ao meu redor que este era um fato mais comum do que pensava. Vi muitos ancorados no passado tentando viver o momento presente.
Se certo ou errado foi uma lição aprendida: olhar para o futuro no final do nosso ciclo não é algo fácil e a escolha de se ancorar no passado é uma opção bem comum.
A segunda grande lição são as tentativas de acordo entre a matéria e o espirito. Tantas vezes me parecia que o espirito queria partir mas um revertério ocorria e o corpo sobrepujava esta vontade. Perguntei a ele de maneira subliminar o porque desta supremacia do corpo sobre o espirito já que estava vivendo uma vida com imagens do passado. Como esperado não obtive uma resposta mas voltei olhar em torno e procurar no passado e vi que este era um fato comum. Parece-me que poucos, muito poucos, conseguem fazer que seu espirito, no desejo da partida, sobrepuje a necessidade do corpo em se manter vivo . Só posso imaginar que estes poucos são aqueles que no final do ciclo tiraram o véu do futuro e conseguiram enxergar bem mais além.
Fica a última lição quando o corpo finalmente se rende ao espirito. É um momento de doce entrega, sem rancor. O desligamento dele foi suave. Madrinha e esposa pareciam sempre estar seu lado. Me sussurrou no pé de ouvido que queria partir e mais baixinho ainda falou que aqui não era sua casa. Me perguntou um pouco depois o que ele devia fazer. Só pude dizer, pai faça o que você quer fazer. Foi a nossa última conversa com sentido. Foi sua despedida e última lição para seu filho tão racional.
Foi sem rancor.
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